Já imaginou se Roberto Gómez Bolaños tivesse seguido a carreira de engenheiro mecânico, como queria a mãe dele? Eu certamente teria economizado umas boas gargalhadas da infância enquanto assistia à sua maior criação, ao lado da minha avó: o Chaves.
“Você tem alguma coisa. Você é diferente. Você é o mais engraçado” – ouviu Bolaños de sua então namorada, quando duvidava se deveria se candidatar a uma vaga de aprendiz de produtor e escritor de roteiros. A família colocava mais fé em um engenheiro.
Ela então arrematou: “Ao sapateiro, seus sapatos”. A frase, que eu tive que parar pra anotar, dá título ao primeiro episódio da série que conta a história do criador e intérprete de Chaves. Comecei a ver no último fim de semana e já indico. Queria eu que minha avó ainda estivesse por aqui pra assistir à jornada de seu personagem favorito.
“Zapatero a tus zapatos” – diz o provérbio espanhol, traduzido pelo Google como “cada macaco no seu galho“. Ainda bem que Chaves entendeu que seu lugar era ali, na vila. Ele se candidatou à vaga de roteirista, dedicou-se incansavelmente à sua vocação e o restante da história você já sabe.
O provérbio caiu macio em meus ouvidos ao fim de uma semana em que ouvi as mais variadas opiniões, vindas das mais diversas fontes, sobre os impactos prováveis da decisão de Donald Trump de taxar em 50% produtos importados do Brasil.
Claro que é natural que um assunto como esse vá da conversa de bar ao banco da universidade. O meu receio é que, ao decidir como agir, especialmente sobre seus patrimônios, as pessoas acabem confiando os sapatos aos marceneiros ou os canos aos sapateiros – em bom português, resolvam dar ouvidos a quem não tem qualquer capacidade pra tratar do tema.
Em momentos de volatilidade dos mercados – eles estarão sempre aí – em geral a pior decisão que você pode tomar é sacudir seu portfólio na mesma proporção, resgatando e aplicando com base em manchetes alarmistas ou opiniões aleatórias de Whatsapp.
Nunca é demais lembrar David Swensen, a maior referência em alocação do mundo: “Investidores sérios não fazem market timing”. Ou seja, eles não ficam tentando acertar os momentos exatos para entrar ou sair de determinado mercado.
Aqui, sobre sapatos, fomos ouvir os sapateiros – no caso, os gestores de fundos que estudaram pra isso e se dedicam integralmente a revisar os cenários, avaliar os impactos e tomar decisões de investimento.
Ao contrário do que muitas pessoas físicas acabam fazendo em momentos como esse, ninguém está dando um cavalo de pau no portfólio.
De forma geral, ouvimos que economicamente o impacto da imposição de tarifas é limitado. Por outro lado, os efeitos políticos e sobre sentimentos são vistos como mais claros, ainda que não sejam percebidos como capazes de, por si só, gerar mudanças estruturais.
De forma geral, ouvimos que economicamente o impacto da imposição de tarifas é limitado. Por outro lado, os efeitos políticos e sobre sentimentos são vistos como mais claros, ainda que não sejam percebidos como capazes de, por si só, gerar mudanças estruturais.
O resultado: volatilidade, que estimulou uma busca por proteções às carteiras e, no caso de alguns gestores de multimercados, uma redução na exposição ao Brasil, nas frentes de juros, moedas ou ações, em relação a outros países que operam nos portfólios.
Bom lembrar que quem tem um portfólio bem construído e diversificado está com o dinheiro de curto prazo investido de forma conservadora – e também carrega proteções como dólar e ouro, que costumam se comportar bem nesse tipo de cenário. Ou seja, pode ter paciência pra esperar o barulho passar.
Quando vejo momentos de volatilidade como este, me lembro do primeiro corte relevante de funcionários que vi em uma empresa em que trabalhei. Era jovem, tinha acabado de mudar de área e logo pensei que ia sobrar pra mim.
Uma profissional mais experiente me viu chorar no canto e depois fazer de tudo pra me inteirar das rodas de fofoca. “Sabe o que você faz em momentos como esse?” – ela me perguntou com firmeza. “O quê?” – eu respondi, ansiosa pelo conselho. “Senta e trabalha”.
É isso. Obrigada, Cláudia.
Avalie hoje se você não está perdendo tempo demais construindo cenários e ouvindo opiniões de gente que não tem qualquer base pra emiti-las.
Acredito em uma dupla poderosa pra construir patrimônio – e assim realizar seus sonhos e proteger quem você ama.
O primeiro ingrediente dessa dobradinha é colocar energia verdadeiramente na sua vocação e fazer dela um trabalho digno – no meu caso, ensinar as pessoas a investir melhor. E no seu?
O segundo é delegar o restante a quem entende mais do que você – seleciono as melhores equipes profissionais pra investir meu dinheiro em renda fixa, bolsa, moedas e commodities no Brasil e no mundo, assim como contrato excelentes médicos, advogados, marceneiros, sapateiros…
As pessoas que construíram um patrimônio sólido que conheço colocaram em prática essa combinação.
O restante é barulho.
E você? Não tem perdido tempo demais especulando e gastando energia com o que não está sob seu controle?
Bateu aí? “Foi sem querer querendo”, como diria um certo engenheiro mecânico.
Um abraço,
Luciana Seabra.